Profissões artísticas em pauta no STF: o que está em julgamento?

Deborah Duprat, Vice-Procuradora Geral da República
(2009-2013), que assinou a ADPF 183
Antes de se posicionar contra ou a favor, entenda melhor o que será julgado pelo STF


No próximo dia 26 de abril, estarão em pauta do Supremo Tribunal Federal duas ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), de números 183 e 293. O assunto vem ganhando repercussão crescente no meio artístico, o que justifica ser pautado também aqui, neste blog.

O que é uma ADPF? Trata-se de um tipo de ação que só é julgada pelo STF. Exemplos de ADPF que tiveram grande repercussão foram a 186/2009, que visava declarar inconstitucionais as cotas raciais na Universidade de Brasília, julgada improcedente; e a ADPF 54/2004, que questionava a ilegalidade da interrupção voluntária da gravidez em fetos anencéfalos, declarada procedente, ambas julgadas em abril de 2012.

Prevista no Art. 102, parágrafo 1, da Constituição Federal, e regulamentada pela Lei 9882/1999, a ADPF tem como objeto "evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público", cabendo sempre que "for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição. É o caso das ações em questão, que pretendem, com base na atual Constituição, declarar sem efeito dispositivos de leis anteriores a ela: a ADPF 183 refere-se à Lei 3857/1960, que regulamentou a profissão de músico e criou a Ordem dos Músicos do Brasil (OMB); e a ADPF 293, à Lei 6533/1978, que regulamentou as profissões de Artista e de Técnico em Espetáculos de Diversões. 
O atual Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Músicos
do Brasil, Gérson Ferreira Tajes

Visto tratar-se de distintas ações, que se referem a leis distintas sobre distintas profissões, é fundamental analisá-las separadamente (ainda que ambas se refiram a "profissões artísticas", o que parece justificar o fato de estarem reunidas na pauta do STF). Vejamos:

A ADPF 183, iniciada em 2009 pela Procuradoria Geral da República, pede que sejam declarados inconstitucionais diversos dispositivos da Lei 3857 - lei que nunca sofreu atualização, desde sua promulgação, em 1960. Segundo a então Procuradora-Geral da República, Deborah Duprat, eles violariam "preceitos fundamentais" contidos no Art. 5 da Constituição Federal, incisos:

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; e
XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.

O relator da ação no STF, Min. Alexandre de Moraes
No pedido, alega que "a simples ideia da existência de um órgão público controlando a atuação de artistas, com poder de lhes impor penalidades, é incompatível com a tutela da liberdade de expressão." Em consequência, a PGR pede que o STF declare inválidos 17 dos 72 artigos da Lei (16, 18, 19, 28 a 40 e 49), além de trechos dos artigos 1, 17, 54 e 55.

Cabe notar, portanto, que os restantes 51 artigos da Lei 3857 não foram questionados pela PGR. A ADPF 183 não pede a extinção da OMB, muito menos da profissão de músico. Na hipótese de ser julgada procedente, a filiação à OMB passará a ser voluntária. (Hoje ela é obrigatória, embora nas duas últimas décadas um grande número de profissionais tenha obtido decisões liminares que os isentaram da filiação e pagamento de anuidade, algumas já confirmadas pelo STF).

Normas que definem o funcionamento da entidade, como as eleições, mandatos e composição de seus conselhos regionais e federal, não foram questionadas, assim como os capítulos que restringem a duração do trabalho dos músicos e diversas disposições gerais, entre as quais a que confere "aos músicos profissionais... todos os preceitos da legislação de assistência e proteção do trabalho, assim como da previdência social." (Art. 60) Tampouco é objeto da ADPF 183 o Art. 53, que obriga os contratantes de músicos estrangeiros que se apresentam no país a pagarem uma taxa equivalente a 5% dos cachês para a OMB (e outros 5% para o sindicato local)

A Advocacia do Senado e a Advocacia Geral da União manifestaram-se favoravelmente ao pedido. A OMB manifestou-se em contrário, através de vários de seus conselhos regionais representados no processo. Todavia, não encontramos manifestações específicas da entidade sobre o tema, nas páginas do Conselho Federal ou do Conselho Regional do RS.

Em 2014, o Plenário do STF já se manifestou por unanimidade, com reconhecimento de repercussão geral, pela não-obrigatoriedade de filiação dos músicos à OMB. (Leia aqui a notícia)
Acompanhe aqui a tramitação da ADPF 183.

Em novembro do ano passado, a Comissão de Educação do Senado realizou audiência pública sobre a OMB, disponível em vídeo aqui.

Na próxima postagem, abordaremos a ADPF 293, cuja tramitação iniciou em 2013.

[Atualização em 4/5/2018: A Ação foi retirada da pauta da sessão do STF de 26/4, sem previsão de próximo julgamento]

Com informações da Página do STF na Internet e da Wikipedia.

2 comentários:

  1. A situação da OMB É MAIS GRAVE E SÉRIA DO QUE IMAGINAMOS! Nunca a Ordem representou os músicos como deveria e como rege a Leim 3857/1960, pelo contrário, só serviu para recolher taxas e enriquecer seus dirigentes de forma ilícta sobretudo, com o recolhimento da taxa de 10% do artigo 53. Saiba mais sobre essa entidade CORRUPTA e acéfala! https://reporteraguia.blogspot.com/2018/06/justica-arquiva-processo-e-garante.html

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  2. Essa pauta merece uma ampla discussão!!!! https://reporteraguia.blogspot.com/2018/06/ugt-e-forca-sindical-sao-apontadas-como.html

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