O contexto do projeto de lei 237/09

"Olhos Atentos"
Foto: Francielle Caetano/PMPA
O Projeto de Lei 237/09, que trata sobre a instalação e retirada de obras de arte de grande porte em terrenos que pertencem ao município de Porto Alegre, pode ser votado esta semana. A discussão em plenário esteve na pauta da Câmara de Vereadores no último dia 9, mas foi adiada por cinco sessões por acordo entre os vereadores.

Buscando colaborar com o debate sobre o projeto, bem como seu contexto, o Observatório da Cultura de Porto Alegre condensou um conjunto de informações que estão disponíveis para consulta na internet. Sempre que possível, os trechos citados de outras fontes estarão com um atalho para os originais.


Esta segunda postagem trata de apresentar o contexto em que o projeto foi proposto, em 2009, a partir de um artigo publicado pelo historiador Voltaire Schilling no jornal Zero Hora.

Baseamo-nos em material localizado na internet, que disponibilizamos no decorrer das postagens.

21/04/2010

Capital poderá ter lei para obras de arte

Vereador propõe regras estabelecendo critérios para instalação de monumentos


Carlos André Moreira
carlos.moreira@zerohora.com.br
Um projeto de lei em tramitação na Câmara Municipal de Vereadores promete barulho em um campo delicado: o dos monumentos e das obras de arte que adornam os espaços públicos de Porto Alegre. Apresentado pelo vereador Bernardino Vendruscolo (PMDB), o projeto propõe critérios para aceitação de obra de arte em parques, praças e ruas de Porto Alegre.

Também prevê, em seus trechos mais polêmicos, a retirada de algumas obras já instaladas se não se adequarem aos parâmetros da lei.

Vendruscolo explica que teve a ideia após a polêmica levantada pelo artigo A Capital das Monstruosidades, de autoria do historiador Voltaire Schilling, publicado na página de opinião de Zero Hora em 25 de outubro do ano passado. O texto criticava o valor estético de algumas obras instaladas em Porto Alegre, como o monumento Estrela Guia, de Gustavo Nakle, ou a Supercuia, erguida por Saint-Clair Cemin nas proximidades do Parque da Harmonia. O artigo gerou ampla discussão sobre beleza, arte e quem decide o que ocupa o espaço público.

Ligado ao movimento tradicionalista, Vendruscolo há anos faz críticas à Supercuia, e aproveitou para apresentar o projeto de lei que, tornaria mais transparentes os critérios para a escolha das obras a serem colocadas em logradouros e praças da cidade:

– Vemos na cidade monumentos que aparentemente não representam nada, não se sabe quem decide.

O projeto está na Comissão de Constituição e Justiça, da Câmara. O texto prevê que toda obra de arte colocada em espaço público precisará ser aprovada por lei. Também prevê a remoção de obras que não se encaixem nos parâmetros legais.

A Associação Riograndense de Artes Plásticas Francisco Lisboa lançou uma moção de repúdio à proposta, que ganhou o apoio de nomes como a da artista Clara Pechansky.

– Esse projeto vai virar lei e permitirá um determinado grupo social que não gosta de um artista retirar a obra da cidade – comenta o presidente da associação, André Venzon.

Autor do artigo polêmico, Schilling considera válido:

– Eu não sei qual é o critério existente na prefeitura para selecionar as obras.Ninguém sabe.
ZERO HORA


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25/10/09

A capital das monstruosidades

Voltaire Schilling

Desde que Marcel Duchamp, um ex-artista cubista, francês de nascimento que escolheu os Estados Unidos como residência, mandou um urinol para ser exposto numa galeria de Nova York e, quase em seguida, em 1915, montou uma roda de bicicleta equilibrada sobre um pequeno banco e a fez passar por obra de arte, abriu-se a Caixa de Pandora dos horrores estéticos que a partir de então invadiram o cenário das exposições de arte.

Para acentuar ainda mais o seu deboche para com o que até então se entendia como arte, Duchamp, um pândego, um moleque crescido, pintou um belo bigode numa imagem da Mona Lisa de Leonardo da Vinci, ícone da pintura ocidental. Como ele não foi confinado num manicômio nem encarcerado por ofensas ao patrimônio estético (interessante observar que nunca o Direito Penal preocupou-se em classificar como crime hediondo quem de propósito fabricasse a feiura!), parte da vanguarda artística ocidental tomou-o como um profeta dos novos tempos. Estabeleceu-se então um deus nos acuda.

Todavia, o que particularmente nos chama a atenção como cidadãos desta nossa capital, que mais uma vez se vê intimidada pelo flagelo de uma nova “instalação”, é a notável concentração de “esculturas” e “monumentos” absolutamente espantosos. Um pior do que o outro.

Nosso calvário começa por aquela mandada erguer pelos burgueses do bairro Moinhos de Vento para celebrar sua vitória em 1964 que se encontra no Parcão (homenagem ao marechal Castello Branco, mas que também pode referir-se ao desembarque de um extraterrestre), chegando ao hediondo “timão” situado na rótula que antecede o museu Iberê Camargo.

Aliás, o primeiro “timão”, que parecia ter esterco como matéria original da sua composição, foi destruído pelos vileiros do Morro Santa Tereza, certamente indignados em terem-no nas vizinhanças (sofriam de uma injusta punição, além da pobreza tinham que encarar diariamente o exemplo da medonhice).

Este colar sem fim de mau gosto que nos assola ainda é composto pelo “cuiódromo”, encravado na rótula da Praça da Harmonia (obra que por igual pode ser entendida como a exaltação de um superúbere de uma vaca premiada), e por um tarugo de ferro enferrujado que adentra o Rio Guaíba nas proximidades da Usina do Gasômetro e que se intitula, pasmem, Olhos Atentos.

Nem os que foram perseguidos pelo regime militar escaparam destas maldades estéticas. O “monumento” que os lembra, erigido no Parque Marinha do Brasil, nos faz supor que eles continuarão atormentados ainda por muito tempo mais.

A gota d’água derradeira destas perversidades que acometem contra nós, pobres porto-alegrenses, foi a inauguração recente da Casa Monstro, situada na Rua dos Andradas. Pelo menos o autor, um jovem paulista, enfim alguém sincero no ramo, não a escondeu atrás de um título esotérico ou poético: é monstruosa, sim!

Trata-se da reprodução de um tumor que, inchado, é expelido pelas aberturas da construção e vem se mostrar aos olhos dos passantes, tal como se fora um abdômen de um canceroso recém aberto pelo bisturi de um cirurgião. Como se vê, uma maravilha!

Minha interrogação, depois de passar rapidamente os olhos sobre este vale de horrores que nos circunda, é por que Porto Alegre, cidade aprazível, moderna, povoada por gente simpática, habitada pelas mulheres mais belas do país e que abrigou artistas como Vasco Prado, Xico Stockinger e Danúbio Gonçalves, termina por excitar o pior lado de muitos que por aqui vêm expor?

Dizem-me que eles deixam estas abominações como doação (por não encontrarem compradores e não quererem arcar com o translado) e a infeliz prefeitura, constrangida, não tem como lhes dizer não.

Faço desde já um apelo ao secretário municipal da Cultura, Sergius Gonzaga, se este ano tal ameaça se repetir, mobilize-se. Levante recursos, promova uma ação entre os amigos da cidade para despachar tais coisas para qualquer outro lugar. Senão, peça socorro à ONU. Porto Alegre, aliviada, lhe será eternamente agradecida.

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Em 2011, um vereador propôs o mesmo projeto na Câmara de Vereadores de Fortaleza, Ceará. Em janeiro de 2014 o projeto foi encaminhado para arquivamento, dado que o vereador proponente não possuía mais mandato e o prazo de tramitação expirou.
http://cmfor.virtuaserver.com.br:8080/sapl/consultas/materia/materia_mostrar_proc?cod_materia=61

Exemplo de artigos que comentaram o artigo de Schilling:
- As obras criticadas por Voltaire Schilling - Fotos
- Sobre arte e monstruosidades - Zero Hora
- Voltaire Schilling: a capital das monstruosidades! - Gunter Axt (Historiador e Gestor Cultural)
- A Capital das Monstruosidades 2 - Elisa Dal Ben Angelo (Blogueira)
- As monstruosidades do Capital - Jorge Barcellos (Historiador)
- Arte na berlinda: A celeuma do ano - Eduardo Veras - Zero Hora - CONTÉM OUTROS LINKS

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