Painel de Encerramento da ICCPR. Barcelona, 12/7/2012 |
Falando em espanhol, Bustamante (à esquerda, na foto), foi um dos mais aplaudidos em sua crítica ao uso generalizado e, por vezes, inconsequente, do termo "indústrias criativas", inclusive em documentos oficiais e programas de governo, não raro como uma panacéia para os problemas sociais e econômicos causados pela desindustrialização, pelas disparidades regionais na União Européia, entre outros.
Quem vê com alguma reserva a "moda" das indústrias criativas encontrará no trabalho de Bustamante um consistente ponto de apoio para a reflexão. Como exemplo, traduzi um trecho de seu artigo "España y Latinoamérica: Economía creativa del entretenimiento digital", que integra o livro, por ele organizado, Industrias creativas: amenazas sobre la cultura digital. (Barcelona: Gedisa, 2011)
"A pesquisa sobre a cultura começa a obter êxito quando passa a considerar-se uma atividade específica e especializada, ligada às transformações sociais do lazer, ainda que inevitavelmente guarde nexos históricos com toda a história da cultura. Este é o grande pilar que permitiu a Bourdieu na sociologia, a Raymond Williams na comunicação social ou a Baumol & Bowen na economia, assentarem as bases fundadoras para a análise científica posterior.
Enrique Bustamante |
É curioso que as análises realizadas sobre as indústrias criativas ou de conteúdos digitais façam tábua rasa não apenas dessas conquistas do conhecimento, mas também da teoria e das pesquisas de quatro décadas sobre as indústrias culturais e seus nexos e diferenças com a cultura clássica, a não ser para rechaçá-las ou ignorá-las. A suposta novidade radical da cultura digital legitima esse esquecimento sistemático e ampara a naturalização 'científica' da obra de gurús, profetas e pregadores das últimas décadas como textos supostamente científicos, legitimados como únicos antecedentes visionários dessas transformações.
Em termos gerais, tal abordagem está dominada por uma visão meramente descritiva da realizade, tão maravilhada pelos efeitos unilaterais do progresso tecnológico que não alcança encontrar causas nem consequências profundas dos processos em curso: não costumam mencionar a propriedade e sua concentração, nem o papel do capital, nem o destino dos criadores, nem a liberdade de escolha real dos usuários, nem o papel dos Estados e da esfera pública. Não obstante, magnifica-se o papel ativo dos usuários para melhor louvar as virtudes naturais da 'nova cultura', e pratica-se uma observação obsessiva sobre as cadeias de valor e os modelos de negócio, que evidencia seus fins exclusivamente mercantis. Uma tarefa difícil em época de transição, quando cada mudança tecnológica é considerada como elemento de modificação instantânea e total da 'criatividade digital', o que nos leva a um panorama caótico permanentemente renovado e incerto."
Enrique Bustamante é Catedrático de Comunicação Audiovisual e Publicidad na Universidad Complutense de Madrid e o verbete dedicado a ele pela Wikipedia traz links para alguns textos disponíveis on-line.
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